O whodunit voltou, bebê!
Whodunit. Palavra estranha, mas fácil de entender: who done it? ou, no bom português, quem matou?.
É aquele gênero de mistério clássico, com pistas espalhadas, um grupo de suspeitos e uma revelação final que deveria te deixar de queixo caído — mas que às vezes só te faz dizer “ah, era ele?”.
Esse formato estava meio morto, jogado no fundo da gaveta junto com DVDs riscados de CSI, até que Entre Facas e Segredos de Rian Johnson trouxe de volta o glamour. De lá pra cá, Hollywood e Netflix saíram em romaria para desenterrar Agatha Christie, bigodes postiços e trilhas sonoras cheias de violinos tensos.
A bola da vez é O Clube do Crime das Quintas-Feiras, baseado no livro best-seller de Richard Osman. E aí fica a dúvida cruel: será que a Netflix entregou charme britânico e mistério aconchegante ou só mais um episódio estendido de novela de chá e biscoito?
Spoiler: um pouco dos dois.
Sinopse: Do livro para a tela
A trama acompanha quatro amigos residentes em Coopers Chase, uma comunidade de aposentados que, em vez de passar a tarde jogando dominó ou discutindo novela, se reúnem às quintas-feiras para investigar crimes não resolvidos.
Tudo vai bem até que a ficção bate na porta: um verdadeiro assassinato acontece na vizinhança e o quarteto, liderado por Elizabeth (Helen Mirren), decide investigar. É a chance perfeita de aplicar suas habilidades — e suas fofocas acumuladas — para resolver um caso real.
Só que, como toda boa história de mistério, nada é tão simples: suspeitos aparecem, segredos antigos vêm à tona e a pacata comunidade de aposentados se transforma em um tabuleiro de xadrez com peças faltando.
Review: fidelidade ou traição?
Adaptar livro amado é sempre cilada. O leitor imagina os personagens, cria expectativa… e o diretor chega com a tesoura.
Chris Columbus (sim, o mesmo de Esqueceram de Mim e Harry Potter) decide deixar a obra mais “Netflix-friendly”: corta personagens, acelera diálogos e inclui cenas de suspense que parecem importadas de outro filme.
Funciona?
Para quem não leu o livro, sim.
Para os fãs, é como trocar chá das cinco por energético de latinha. Dá uma adrenalina, mas perde aquele sabor aconchegante e cheio de detalhes que Osman entrega no papel.
O maior pecado? O ritmo acelerado. O livro é paciente, gosta de ouvir histórias de vida, saborear uma piada, deixar o mistério respirar. Já o filme parece ter medo de que você pause para ir ao banheiro e nunca mais volte.
Os quatro mosqueteiros da terceira idade
Se o roteiro divide opiniões, o elenco é unanimidade. O quarteto principal carrega o filme nas costas com tanta elegância que até dá vontade de assinar a Netflix só para vê-los tomando chá.
Helen Mirren (Elizabeth) – praticamente a rainha do filme. Mistura inteligência, ironia e carisma com tanta naturalidade que parece se divertir mais que todos.
Ben Kingsley (Ibrahim) – transforma seu personagem em uma mistura de psicólogo metódico e comediante sem querer.
Celia Imrie (Joyce) – rouba cenas com sua doçura, especialmente quando vibra com a chance de investigar um crime de verdade.
Pierce Brosnan (Ron) – sim, o ex-007 de bigode grisalho funciona como o ranzinza carismático.
O melhor momento? Brosnan e Kingsley juntos. É tipo ver James Bond aposentado discutindo filosofia de boteco com Gandhi.
Bastidores e curiosidades
Diretor de clássicos natalinos no terror britânico light – Chris Columbus, famoso por Esqueceram de Mim, trouxe sua veia de “filme para toda a família” até para um whodunit. Resultado: nada muito sangrento, nada muito chocante.
Mudanças polêmicas – personagens queridos do livro foram cortados e a resolução foi suavizada para agradar o maior número de assinantes. Se Richard Osman escreveu um mistério agridoce, Columbus entregou um final “quentinho no coração”.
Ambiente como personagem – Coopers Chase ganhou tanta atenção no design de produção que quase merece um crédito no elenco. Apartamentos cheios de detalhes, jardins que parecem saídos de Pinterest e aquele ar de comunidade onde até o vizinho que te empresta açúcar pode ser um assassino.
Elenco e produção
Além dos quatro protagonistas, o filme conta com participações de David Tennant (sempre roubando cena), Richard E. Grant e outros nomes do casting britânico que fazem qualquer fã de Doctor Who e Downton Abbey sorrir.
Na produção, a Netflix já dá sinais claros: quer transformar O Clube do Crime das Quintas-Feiras numa franquia. Algo como Agatha Christie Cinematic Universe. E, sinceramente? Não seria má ideia — desde que alguém dê mais coragem ao roteiro e menos medo de arriscar.
Final explicado: quem matou quem?
⚠️ Alerta de spoilers para quem ainda não viu.
Angela Hughes – morta nos anos 70 pelo namorado abusivo, Peter Mercer.
Peter Mercer – morto por Penny, uma das fundadoras do Clube, que o enterrou em Coopers Chase para esconder o crime.
Tony Curran – assassinado por Bogdan, o jardineiro, em legítima defesa.
Ian Ventham – envenenado por John, marido de Penny, para proteger o segredo da esposa.
Penny e John – morrem juntos em um pacto final com fentanil.
No fim, a moral não é apenas quem matou?, mas por que matou?. O desfecho levanta questões sobre amor, justiça, envelhecimento e até dignidade na morte.
Onde assistir O Clube do Crime das Quintas-Feiras
O filme está disponível exclusivamente na Netflix.
Recomenda-se assistir com:
1 fatia generosa de bolo,
1 xícara de chá,
e 0 pressa, porque apesar do ritmo acelerado, você vai querer saborear cada atuação.
Trailer de O Clube do Crime das Quintas-Feiras
Veredicto final: vale a pena?
Se você nunca leu o livro: sim, é uma ótima pedida para uma noite de sofá com vinho barato.
Se você leu o livro: vai rolar aquela sensação de versão “light”. Menos camadas, mais correria.
No fim, O Clube do Crime das Quintas-Feiras não é a reinvenção do whodunit, mas é aconchegante, engraçado e cheio de estrelas. Para a Netflix, já é vitória: finalmente um filme de mistério que não dá vontade de desligar no meio.